Toda vez que alguém me chama de fofa eu penso que dei errado. Anos e anos tentando criar uma imagem de inconsequente, vagabunda e maluca, pra no fim falarem que sou fofa? É esse o mundo que vou deixar pros meus filhos? Crianças, a mamãe tentou de tudo, se esforçou pra revolucionar o seu pequeno universo, honrar as avós que queimaram os sutiãs das bruxas na fogueira, mas... acabaram achando que eu era fofa.
Na minha infância, eu ia pra escola segurando o discman no colo e cantando baixinho, de olho fechado, na van. Uma vez o menino do meu lado me perguntou o que estava ouvindo e eu disse: Guns N’ Roses. "Nossa, mas as meninas da sua idade gostam é da Britney Spears”. E eu, que nessa época ainda era uma criança meio tomboy, comecei a ficar preocupada com minhas roupas maloqueirinhas e minha playlist metalliquer: “se eu continuar desse jeito, nenhum menino vai gostar de mim”.
Comecei a escutar Mariah Carey e me vestir como ela no clipe de Heartbraker: top decotado de crochê, barriga de fora e calça jeans apertada. Era a adolescência chegando e com ela o desespero pela aprovação masculina. Entendi que podia escutar Nirvana em casa, mas nas festinhas eu saberia toda as coreografias das Spice Girls e sorriria para os meninos de uma forma sedutora, ainda que todos eles estivessem com cecê, fiapo de bigode e apaixonados demais pelos seus amigos pra me notarem.
E foi da adolescência até algum lugar da vida adulta (nem sei se posso dizer que isso oficialmente terminou) que passei uma era tentando ser notada, vista e validada por um homem. Qualquer um. Ainda que pra isso eu precisasse usar roupas que me machucassem, fazer coisas que nem sabia se gostava, e ser uma fofinha. Não pode xingar, que homem não gosta. Não pode ficar brava, que homem não gosta. Não pode dizer não, que homem não gosta. Não pode ser puta, que homem não gosta.
É tanta coisa que homem não gosta, que comecei a não gostar disso.
No clipe de Heartbreaker, não sei se vocês lembram, mas a Mariah cai na porrada com ela mesma, e foi assim que a Mariana tomboyzinha rebelde rock star da infância voltou pra dar uns tapas na Mariana que começou a querer ser igual a spice girl Emma, mesmo que a alma fosse da Sporty.
Hoje, me identifico mais com a criança livre e não muito aí para meninos que fui, que com a jovem machocentrista que tentei ser. Até porque quando a gente coloca o homem no centro tem uma grande chance de ficar pra escanteio. Entendi que não queria mais ser fofa, conveniente ou sempre sorridente. Ou eu começava a incomodar, ou viveria incomodada.
Decidi – olha a grande revolução – ser eu mesma, com menos fofura e mais bravura. Homem não gosta. Mas eu adoro.